composição | arar o solo com derivas e mistérios
Flávio Rodrigues
Como elementos preambulares, recorro a quatro folhas brancas quadradas, separadas por uma pequena margem, onde repousam objetos e materiais encontrados em caminhadas por ruas e praias, bem como em visitas a casas e fábricas abandonadas. Ao longo do processo, os materiais que foram, digamos, marcando presença, destacam-se por sua característica fragmentada, como, por exemplo, materiais arenosos.
Inicialmente, o que me interessou foi recolher essas materialidades associadas a uma ideia de natureza — extraídas e colocadas em contextos de construção, como uma casa, por exemplo, que se desmoronou, deixando esses elementos deslocados de seu ponto de origem, negligenciados e desprovidos de funcionalidade. No estúdio, esses materiais, através de uma dinâmica de afeto, são cuidadosamente tratados, alojados e reparados como elementos fulcrais, resgatando-lhes e atribuindo-lhes novas potencialidades, significações e virtualidades.
A edificação que se ergue sobre e entre as folhas emerge de maneira semelhante e em continuidade com criações anteriores, originando-se de práticas experimentais e intuitivas, sendo processual na sua construção e reflexão, com um caráter performativo e resultando em um dispositivo expositivo.
Flávio Rodrigues
Sou um artista que iniciou o seu percurso na dança e no desenho em 1992, sob a orientação da professora e artista Alexandrina Costa. Concluí o curso em Dança Contemporânea no Balleteatro Escola Profisonal (2002) e fiz formação no Ginasiano (1996), Dance Works Rotterdam (2005) e Núcleo de Experimentação Coreográfica (2008). Além disso, frequentei o curso de Intervenção Pública e Criação de Obras Site-specific na Universidade Lusófona (2009) e o curso de DJ na escola Bimotor (2015).
Desde 2006,tenho desenvolvido os meus próprios projetos de criação artística multidisciplinar, experimental, processual e com caráter autobiográfico. O desenho, a performance arte, a manipulação de objetos, o som, o movimento e a escultura são os meios essenciais aos quais recorro. Como performer, proponho-me à construção e composição de dispositivos intuitivos, ao utilizar materiais, sonoridades, imagens e objetos principalmente provenientes de processos de encontro espontâneo, reaproveitamento e respigação. A caminhada e o estado de deriva têm emergido como base processual meritória.
Os meus projetos têm sido desenvolvidos, apresentados e expostos em diversos lugares, em parceria com diferentes estruturas, como Teatro Municipal Rivoli (Porto), Arte Total (Braga), Ilka Studios (Hannover), 4BidGallery (Amsterdam), Rua Gaivotas 6 (Lisboa), Faculdad de Bellas Artes U.C.M./Acción Spring(t) (Madrid), Lake Studios (Berlim), Centro de experimentação artística CEIA (Moita), Festival Mandala (Wrocław), Territori Festival (Ibiza) ou Correios em Movimento/Dança em Trânsito (Rio de Janeiro).
Paralelamente ao desenvolvimento de minhas próprias criações e pesquisas, tenho colaborado como figurinista, músico, cenógrafo, performer (entre 2006 e 2017) e assistente de ensaios com diferentes artistas e companhias. Sou artista associado do Balleteatro, onde desenvolvo projetos de criação e formação na Escola Profissional, além de co-curadoria dos programas Corpo+Cidade (desde 2014) e Extemporânea (desde 2023).